Eu não gosto do Natal. Fico sempre mais melancólico do que de costume. Esta data, como outras tantas, foi construída para estimular o consumo, como todo mundo sabe. No momento em que vivemos somente para ter crédito para consumir, assuminos uma identidade que não é originalmente nossa. Vem de outra sociedade, que inclusive é aquela que mais se beneficia com nossa assimilação do seu jeito de existir.
A assimilação é tão profunda, que somos obrigados a aturar papais-noel de roupa de esquimó em pleno verão, além das estúpidas renas que jamais um brasileiro viu na vida. Na minha infância, era comum jogarem talco sobre o "pinheiro" de plástico para simular a neve. Com o suor comum da época, lembro que aquele talco esfumaçava o ambiente até grudar na pele. Era um horror...
Todo mundo se endividava para "agradar" uns aos outros. Nós, as crianças, só nos preocupávamos com a meia-noite, horário em que éramos liberados para atacar os pacotes, quando havia mais de um. Felizmente, como era Natal, nossos pais nos deixavam ficar brincando na rua durante a madrugada. Sempre alguém da rua ganhava uma bola. Meu irmão gostava muito da ceia também. Eu, nem tanto. Por isso, para mim, depois dos presentes, ficar brincando na rua de madrugada era a melhor parte. Nem sei se isso ainda existe, mas era divertido.
Mais "adultos", o Natal virou para nós uma excelente desculpa para fazermos merda, como nos embriagar ou querer jogar talco no "pinheiro". Até que nem reunir a família ficou mais tão divertido. Ninguém mais tinha saco de fingir que era legal. De se obrigar a se divertir. De se obrigar a se mostrar feliz perante aquelas pessoas que literalmente te neurotizaram ao longo da infância: pais, irmãos, avós, tios, primos... Apesar de haver algozes e algozes, a bem da verdade é que ninguém escapa.
Se você nasceu no berço de uma família cristã romântica e parnasiana, desconsidere minhas palavras. Aproveite o Natal do seu modo, com seus pais ainda casados e felizes, que inclusive acabaram de adotar uma criança em sua viagem pela Pastoral Infantil à Etiópia, no último inverno. Os avós, lúcidos e bem-casados, não sabem se celebram mais o novo netinho ou a sua gravidez. É claro que você, no alto de seus trinta anos, já se formou, casou com o melhor partido cristão da cidade, e já está a espera do segundo filho. João Pedro completa um aninho no mês que vem. Tudo isso com a benção de Deus, naturalmente.
Então, nesta data tão especial, quando o Ocidente realiza seu grande potlatch, relaxe se você se achar nadando contra a maré. Além de não estar sozinho nessas águas, há sempre de se aproveitar o feriado, seja do jeito que for.
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